terça-feira, março 27, 2007

O Bêbado e a Equilibrista

“Caía a tarde feito um viaduto...” e a equilibrista atravessava as duas torres gêmeas por um fio com o pau na mão, quando passou o bêbado, em seu minúsculo avião, por entre as pernas do World Trade Center, sem nada derrubar, a não ser a equilibrista, que caiu feito a tarde feito um viaduto bem no assento traseiro do teco-teco:

- Você me desequilibra. – Disse ao que bebia.

Pousaram numa ilha deserta e se amaram a noite toda sob a lua que, “tal qual a dona de uma bordel, pedia a cada estrela guia, um brilho...”. Até que o sol nasceu – porque ele nasce todos os dias – e, como não pegasse nem no tranco, o teco-teco, saíram a caminhar pelas praias, ela equilibrando-se nas pedras, ele tragando os ares de tanto amor:

- Você me inebria. – Disse à bambolê.

Era tanto mar, era tanta areia, era tanta brisa, era tanto olhar, que os dias foram passando e os dois mais se perdiam entre o mar e amar: “um bêbado com chapéu-coco...” e a equilibrista ... “na corda-bamba de sombrinha...”. Mas “...em cada passo dessa linha, pode se machucar...”.

- “Azar!” – Disse o bêbado.

E ali estavam os dois, “... num rabo de foguete...”. Mas no rabo do foguete ela amarrou sua linha de equilibrista e partiu por ali mesmo, um pé depois do outro seguindo o fio de sua meada, enquanto o bêbado tropeçava um pé depois do outro se enrolando na mesma linha.

- “Que sufoco!” – Disse a equilibrista.

“Mas o show de todo artista tem que continuar...”


N.A. – Música “O Bêbado e o Equilibrista”, de João Bosco e Aldir Blanc, que trata de tema político, numa referência aos anos
60/70 e à anistia no Brasil.

domingo, março 11, 2007

Mulheres de meu marido

Essa divertida crônica, no mês da mulher, é para convidar a todos (e todas, claro!), antecipadamente, para a estréia da minha peça musical “Celas”, sobre a violência psicológica contra a mulher, em 4 de maio de 2007, no Teatro Municipal de Araruama, estrelada pela atriz e cantora Milena Lizzi e dirigido por Ângela Dantas.


Às mulheres que dormiram com meu marido


Digam-me uma coisa, caríssimas, ele canta Dom Giovanni inteirinho deitado ao seu lado na cama, antes e/ou depois de fazer amor? E se canta, vocês se emocionam às lágrimas? Ele tem uma voz linda, não é mesmo? Sabe aquela parte da Espanha, em que o Leporello mostra à Donn’Elvira a caderneta de anotações com as namoradas do seu bem-amado? Pois é, “in Ispagna son già mille e tre”. Eu sempre me divirto nesta parte.

Certamente, ele lhes chamava pelos nomes e não de “querida” com medo de esquecer ou trocar algum, não é? Clôs, Marlenes, Junias, Carmens Silva, Sônias, Graças, Isolinas, Serafinas, Dulcinéias, Françoises... Imagine guardar tantos nomes... Só ele mesmo. Mas são todas, realmente, muito “queridas”. E de meu amor, ele lhes chamava?

Contem-me, ele lhes disse que pensa em vocês todos os dias e lhes convidou para irem à Europa ou a qualquer outro lugar? Sim, porque ele adora viajar em boa companhia e nem sempre eu posso ir com ele. Vocês sabem, alguém tem que trabalhar para sustentar a família, né mesmo? E na rede, entre estrelas e um copo de uísque, vocês percebiam seus olhos umedecidos denunciando uma “sodade” cantada por Cesária Évora? Ele é tão sensível...

Mas, naquele momento mágico, depois de uma extenuante noite de amor e muito sexo, em que ele chegava finalmente ao orgasmo depois de ter feito vocês irem às nuvens, naquele momento de seu mais profundo prazer, ele lhes olhava nos olhos e lhes declarava amor eterno? Ele é muito bom mesmo, né? Por isso compreendo perfeitamente o assédio de todas vocês, ligando desesperadas para a minha casa, pedindo até mesmo para eu dar recados a ele. Claro que eu dava, eu respeito essas coisas, sabe? Principalmente, quando, por meu intermédio, uma de vocês desistia da relação e insistia ao telefone:


- Diga a seu marido que está tudo terminado entre nós dois.


Devo dizer que minha vida com meu marido, graças (e sônias e mirians e etcéteras) a vocês tem sido extremamente divertida e movimentada. Muito obrigada por hilariantes momentos! Ah, e agradeço também pelos elogios a minha casa, realmente, muito bem decorada. Algumas, quando estiveram aqui, na minha ausência (grande pena, pois eu teria adorado compartilhar a minha cama com vocês também) deixaram recados com ele que, gentilmente, me repassou. Foram todas muito amáveis. Voltem sempre! Ah, quem esqueceu um travesseiro? Foi você, Sônia? Maciiiio!

Uma última dúvida: com o meu namorado Ricardo, vocês não dormiram não, né??? Ah, bom! Senão o pau ia quebrar!

quinta-feira, março 08, 2007

A Alma feminina


A feminina alma incrivelmente
se parece com a harpa.
Dedos que a tocam devem ser capazes
de sentirem plenos os vazios
entre as muitas cordas.

A alma feminina é como a poesia.
Não se pode tê-la,
A não ser o que nela transcende,
perdendo para a convivência mortal do papel.

A alma feminina parece rio,
Quanto mais selvagem,
podemos encontrar sentimento, diamantes...

Cau (em memória)

Esta semana abro espaço para alguém que, em vida, percebeu e descreveu tão bem, a

alma fêmea,
gêmea por nós
em nós desatados
a sós.