segunda-feira, agosto 18, 2008

Quem quer comprar? Quem vai vender?

Joana Bacana estava toda contente. Ia começar a festa e ela já estava se preparando. Queria uma casa linda! Aliás, na casa dela, Joana era a única que gostava, que ficava contente, ninguém mais, mas ela não perdia uma. Ficava ali plantadinha em frente à televisão, esperando passar e assistia todas as propagandas eleitorais gratuitas ou não. O que ela queria, na verdade, era escolher pra quem ia vender seu voto este ano.

Na última eleição seu voto lhe valeu boa parte das telhas de seu telhado novo. Telhas de barro. O telhado ficou show, pelo menos a parte que conseguiu cobrir com as 120 telhas, porque o resto continua com aquele amianto quebrado que comprou fiado no Mercadinho da Construção. Estes ela teve que pagar do seu bolso mesmo e levou quase um ano para saldar a dívida. Aquele seu Geraldo do Mercadinho bem que podia ter se candidato também, mas ele tem horror à política.

Apesar do telhado novo, Joana Bacana não conseguiu matricular sua filhinha na escola pública no ano seguinte à última eleição, nem com a ajuda do comprador de seu voto, que afinal, se elegeu.

Esse ano, ela estava pensando em ganhar um pouco mais, afinal, pode vender dois votos: um para prefeito e outro para vereador. E para prefeito, vocês sabem, é mais caro.

Sentada em frente à televisão, Joana fazia seus planos, diante dos anúncios dos candidatos:

- Ô madame aí do sofá, vê se dá uma colher: vote em Zé Mané!

Joana Bacana dava um salto da poltrona, ofendida:

- Tá maluco? Que colher que nada, eu é que quero o meu filé.

E lá vinha uma candidata:

- Companheiras, não vendam seu voto, ele é a sua garantia de um futuro melhor...

Indignada, Joana ameaçava desligar a televisão:

- Onde já se viu, é muita cara de pau dessa daí. Quer o voto de graça... Depois vai lá ganhar os tubos nas minhas costas e às custas do meu voto.

E finalmente, o candidato ideal para Joana Bacana.

- Alô comunidade da Conchinchina Bacana, estaremos aí com nossa caravana da alegria no próximo comício. Compareça e leve pra casa a nossa promessa de dias melhores.

Esse sim, pensava Joana, esse é o homem. Se arrumava e partia pro comício com a filhinha nos braços, avisando a todos os vizinhos.

- Vambora minha gente, que a caravana da alegria tá chegando. – E todos do bairro seguiam para o comício.

Mal sabe a Joana Bacana que a caravana da alegria dura somente três meses, que passados, não trarão para ela nem para os seus vizinhos, os sonhados melhores dias.

Joana Bacana não sabe, mas vendendo seu voto, sua filhinha vai continuar sem escola, seu marido vai continuar sem emprego fixo, sua rua vai continuar sendo esse valão de esgoto a céu aberto, sua televisão vai continuar sendo a mesma que sua patroa lhe deu porque não tinha mais o azul e a imagem é aquela coisa assim entre o vermelho e o amarelo...

- Mas tem controle remoto!

Tá certo, Joana, tem o controle remoto da televisão, mas o controle da sua vida e de seus vizinhos vai continuar nas mãos daqueles para quem você vendeu seu voto. Os seus direitos como cidadã, tais como escola para sua filhinha, emprego para seu marido, esgoto sanitário para sua rua, saúde para você, sua família e sua comunidade, estes e outros direitos, sim, ficarão cada vez mais remotos.

Sai dessa, Joana, você é bacana e seu voto não é banana!

6 comentários:

Anônimo disse...

Adorei! A sua cara! Humor e sarcasmo!
Você está realmente aprimorando um estilo que é só seu.
Solar e dark. Pode?!
Pra cima com dá-lhe dedo na ferida!
Bjs! Maria

Aline disse...

Muito bom, Morgana! Teu estilo é poético, às vezes quase rima!
E o assunto, daqueles que nunca se esgotam!

Parabéns!

Anônimo disse...

É muito bom. Daria um ótimo esquete teatral para ser levado em praças, escolas etc.
Luzia
luziafonseca@yahoo.com.br

José Calvino disse...

Querida Morgana,
Gostei do seu bom humor nas rimas!
Realmente as Joana Bacana, devem sair dessa: "... Sai dessa, Joana, você é bacana e seu voto não é banana!", rsrs
Os candidatos políticos estão eufóricos na caça de votos. Prometem "Deus e o Mundo"! Está faltando contratarem o judoca garoto-propaganda para gritar nervosamente no vídeo: "Me dá! Me dá o voto!" Ou Tiririca falando: "Vivo disso graças a Deus". "Caipira ô Caipira,/a gente não é bandido,/e o meu voto ninguém tira..." É vergonhoso. Muda Brasil!!!
Beijos do,
José Calvino
Recife

Ventura Picasso disse...

Voce é maravilhosa, Morgana. Encontrei c/dona Maria que perguntou: Picasso diz aí uma coisa; qual candidato pode pagar o meu IPTU?
Na cidade tem uma campanha no jornal 'Folha da Região" com o seguinte título:"Eu não vendo o meu voto". Com certeza, a Joana Bacana vai achar uma caretice. É uma pobreza de mão dupla, sendo que por aqui, quem é do contra apanha na rua... e viva a boiada araçatubense. bjusssssssssssssssss

Nathi disse...

Sabe, votei pela primeira vez este ano..não foi assim aquele extase,afinal estamos onde estamos e a perspectiva de mudança é sempre "remota"..mas o que vale é não esmurecer!
Obrigada pela exortação e com certeza:
"SEU VOTO NÃO É BANANA"!!